
No dia 16 de agosto, aconteceu no Instituto de Ciências Sociais Aplicadas (ICSA) da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) a intervenção “Quando o não, não é uma opção”, proposta pela disciplina Corporalidades, do curso de Jornalismo, pelo professor Evandro Medeiros. Foi um momento para refletir sobre os corpos e seus pertencimentos no mundo – principalmente os femininos – em que dois jovens se colocaram à disposição do público, que podia pintá-los com as tintas disponíveis.
A intervenção nos transporta para um ambiente de medo e insegurança, no auditório do ICSA, em que notícias escritas e impressas em cartazes sobre os abusos e feminicídios recentes no Brasil, com roupas penduradas e luzes apagadas. Além disso, um áudio é passado em looping, falando desses sentimentos do que é ser mulher nesse país – que nos mata, nos despreza e ignora nossas dores.
De acordo com o último relatório do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, estima-se que no Brasil ocorram 822 mil casos de estupro por ano, sendo mais de 80% das vítimas, mulheres. Esses números nos alertam para essa epidemia que ocorre e não é colocada como prioridade nas notícias que acompanhamos, por isso, a intervenção nos provoca ao apresentar casos reais que ocorrem ao nosso redor a todo momento – segundo o IPEA, seriam 2 estupros por minuto.

Existe uma concepção errada de que os corpos femininos pertencem aos homens e, além disso, de que quando sofrem violências, elas são culpabilizadas por suas próprias dores. É preciso refletir sobre esses padrões e papéis dentro de nossa sociedade e confrontar nossas próprias noções preestabelecidas sobre gênero, poder e controle – justamente o que é aguçado na intervenção.
“Quando o não, não é uma opção” traz referências de uma das principais artistas performáticas contemporâneas, Marina Abramović, que desafia seu corpo e sua mente em suas intervenções artísticas. Em “Rhythm 0”, de 1974, a artista se colocou disponível por 6 horas com 72 objetos em uma mesa que poderiam ser utilizados da maneira que o público entendesse.
Ao final, ela estava com vários cortes em seu corpo e tinha sofrido diversos abusos, e, segundo relatos da época, um homem teria apontado uma arma carregada – disponibilizada por ela – para seu pescoço. Marina teve o intuito de explorar as relações de seu corpo com o público, os seus limites pessoais e as possibilidades da mente.
Os resultados da performance de 74 refletem como os corpos femininos são vistos e desrespeitados por essa sociedade que os enxerga como propriedade e lugar de violência. Nos resultados de “Quando o não, não é uma opção”, ainda vemos reflexos dessa sociedade patriarcal, misógina – não somente com pinturas mas também comentários feitos –, mas já pode-se vislumbrar um momento de maior reflexão acerca do tema.

Por Lia Junqueira.
