“Mulheres vulneráveis”: A arte como grito contra as violência de gênero 

 

Participante do Ninfeias durante a ação “Mulheres Vulneráveis. Foto: Ana Luiza Rodrigues.

No dia 30 de novembro, às 15h, aconteceu nas ruas do Centro Histórico de Ouro Preto-MG a ação coletiva “Mulheres Vulneráveis”, idealizada e organizada por alunas e professora do curso de Artes Cênicas e participantes do Núcleo de investigações feministas (NINFEIAS) da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Na ação, mulheres se deitam nas calçadas, principalmente próximas às repúblicas masculinas, e simulam estar inconscientes. Outras pessoas do projeto, os “anjos”, ficam pelas proximidades vigiando e protegendo. É uma experimentação artística que referencia casos de mulheres violentadas em ambientes urbanos de acesso público, como forma de protesto,  de incomodar e fazer pensar sobre essas questões. Fazer homens pensarem sobre essa questão.

A ação “Mulheres Vulneráveis” foi realizada como parte da disciplina de Artes e Contemporaneidade do Departamento de Artes Cênicas da UFOP. Surgiu da proposta de uma aluna em um momento delicado, após uma colega de curso ter enfrentado violência sexual e tirado a própria vida. Na mesma época, ocorreu o caso da jovem que foi abusada após sair de uma festa e ser deixada desacordada na rua durante a madrugada. Esse incidente motivou a realização da ação, levando as participantes a redigirem um manifesto contra a cultura do estupro para destacar ainda mais a questão.

É quase impossível olhar para a rua, ver corpos de mulheres caídos, frágeis e inseguros e não se lembrar do caso de estupro que ganhou repercurssão nacional e contribuiu para a idealização do projeto “Mulheres Vulneráveis”. Na madrugada de 30 de agosto, em Belo Horizonte, uma mulher de 22 anos, após sair alcoolizada de um show, foi deixada em um carro de aplicativo por um amigo. Ao chegar ao destino, com a mulher desacordada no veículo, o motorista tentou contato pelo interfone, mas não conseguiu. Ela, então, foi abandonada inconsciente no meio-fio em frente ao seu prédio pelo motorista e por outro homem que passava pela rua. Cinco minutos depois de ficar desacordada na calçada, um quarto homem passa, Weberson Carvalho da Silva. A coloca nos ombros e a leva para um campo de futebol. Onde a estupra. Em cenas que parecem retiradas de um filme de terror, captadas por câmeras de segurança, podemos acompanhar a mulher sendo carregada, como um objeto pelas ruas.

Parte final da ação “Mulheres Vulneráveis” nas ruas de Ouro Preto. Foto: Ana Luiza Rodrigues.

Após a ação “Mulheres Vulneráveis”, as participantes fizeram uma roda de conversa para partilhar o que viram e escutaram nas ruas. Algumas pessoas ignoraram a situação, considerando-a apenas um “teatro”. Outras pararam por curiosidade, leram o manifesto contra a cultura do estupro que estava disponível próximo às mulheres deitadas, enquanto algumas observavam com receio e preferiam manter distância. Até mesmo a polícia fez uma parada, e uma policial desceu da viatura para entender a situação. Os “anjos” explicaram, e a questão foi resolvida. Muitas pessoas também pararam e insistiram em oferecer ajuda, em sua grande maioria mulheres. Esse conjunto de acontecimentos abre questionamentos. E se uma mulher tivesse cruzado o caminho da jovem antes de Weberson? Por que nenhum dos quatro homens demonstrou preocupação com a segurança da mulher?

Nas ruas de Ouro Preto, durante a luz do dia, cinco mulheres “desacordadas”. Com várias pessoas próximas a elas, ainda assim houve situações desconfortáveis. Um grupo de homens parou próximo à ação e começou a falar alto de modo a afrontá-las. “Essa aí eu não aguentava”, disseram para uma das mulheres, às 15h30 da tarde numa rua movimentada. “Deve estar chapada, é normal por aqui”, “Deve estar bêbada, vindo de uma festa, tá perto de uma república”, foram frases escutadas também. Não importa a hora, o local ou a roupa, mulheres em situação de vulnerabilidade merecem ajuda, sem serem questionadas. Seus corpos não são públicos e precisam ser respeitados e, em situações de fragilidade, mantidos íntegros e ilesos. Mulheres têm o direito de se divertir e ir a festas. É constitucional o direito ao lazer, nada justifica a violência e o abuso. 

“Uma mulher não está vulnerável por estar bêbada ou usando batom vermelho. Uma mulher não está vulnerável por estar usando roupas curtas. Uma mulher só está vulnerável pois sempre, à espreita, há um homem.” Esse é um trecho do contra a cultura do estupro. Vivendo num mundo rodeado por essa cultura, mulheres não estão suscetíveis à violência apenas de madrugada sozinhas, desacordadas nas ruas. Estão suscetíveis à violência em casa, em festas de república e até mesmo dentro da universidade. Por isso, o Brasil registrou número recorde de estupros em 2022, com 74.930 vítimas no ano, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.  

Se você foi vítima de abuso, procure ajuda. Na Universidade temos a Ouvidoria Feminina, que é um órgão oficial que atua no recebimento de denúncias de violência contra a mulher no âmbito da universidade, incluindo nas repúblicas federais e moradias estudantis, nos termos da Resolução Cuni nº 2.249.

O número para contato é (31) 9 8866-7678. 

O e-mail: ouv.femininaufop@gmail.com

Manifesto contra a cultura do estupro:

file:///C:/Users/UFOP/Downloads/manifesto%20_compressed.pdf

 Por Ana Rodrigues.

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