Por que as pessoas trans estão constantemente ligadas à violência?

Foto: Lia Junqueira

No dia 19 de janeiro, Lua, Zuri e sua irmã, que não teve o nome divulgado, foram agredidas em uma casa de samba na Lapa, Rio de Janeiro, a “Casa do Firmino”. No local, as vítimas sofreram intimidações e constrangimentos e, além disso, não tiveram qualquer chance de se defender e foram hostilizadas inclusive por seguranças da casa noturna. O motivo? Duas delas são mulheres trans. 

Com o intuito de preservar não somente a identidade dessas mulheres, mas também como forma de preservar mais uma vez suas integridades físicas, preferi não republicar as fotos desses corpos feridos. Sendo essa uma forma de (re)violentar e reviver traumas com os quais elas já estão lidando diretamente. 

O Brasil lidera o ranking de países que mais mata pessoas trans no mundo e esse caso foi mais uma prova dessa virulenta realidade. Eram cerca de 30 homens batendo, chutando e tentando assassinar três mulheres, com uma única motivação: havia duas mulheres trans ali. Mas por que isso? Por que toda essa violência? 

Não tem uma resposta certa para algo tão brutal como esse caso e tantos outros assassinatos de pessoas trans no país. No entanto, é possível traçar alguns caminhos que constroem e fomentam esse tipo de agressão por aqui – e também no mundo. Um conceito que pode ser abordado é o da “masculinidade hegemônica”, em que homens possuem privilégios e poder sobre as demais pessoas e demonstram isso com a força, virilidade e domínio másculo. Além disso, é traçado um ideal de como esse mundo deve funcionar: hétero, cisgênero e branco – qualquer coisa que fuja, está condenada. 

Dessa forma, existe uma pedagogia da sexualidade e também dos corpos, como afirmado pela autora brasileira Guacira Lopes Louro em sua obra O corpo educado, que nos faz aprender e performar de acordo com essas “normas” impostas pela sociedade patriarcal. Porém, quem não possui essa performidade heteronormativa e cisgnênero, por exemplo, enfrenta uma realidade dura e penosa para sobreviver. 

Propondo uma reflexão, o sistema em que estamos inseridas está errado ou, de fato, devemos encaixar todas as pessoas em lugares que, muitas vezes, não as cabem? Acredito que a resposta seja um tanto quanto fácil, porém, a solução precisa perpassar muitas coisas. As notícias de Lua e Zuri me fizeram relembrar um caso brutal de violência contra uma mulher trans, Dandara, que foi assassinada em sua cidade e o vídeo de sua morte circulou pelas redes sociais por todo o Brasil. 

Enquanto esse corpo já estava morto, ele era assassinado mais e mais vezes enquanto as imagens de sua morte circulavam. Dessa maneira, Dandara era (re)violentada e (re)assassinada. Mas o que os casos têm em comum para além de serem mulheres trans? Bom, a reprodução de uma série de violências vai passando de um indivíduo para o outro até tomar uma proporção gigantesca – assim como observamos a vida “sem peso” de pessoas trans por aqui. Não só sem peso, mas também são vidas nuas, das quais são retirados os direitos, como propõe o pesquisador Carlos Magno Camargos Mendonça

Sendo assim, o local de morte, agressão e direitos violados é constantemente atrelado a esse grupo, o que é reafirmado pela mídia, pela polícia, pela cultura e tantos outros, nos fazendo acreditar nessa falsa verdade. É preciso desmistificar e, de fato, reconstruir a dignidade e direito à vida de uma pessoa trans. 

 O dia 29 de janeiro é marcado como o “Dia da Visibilidade Trans”, em que é fundamental ouvir e aprender sobre como valorizar, respeitar e celebrar esses corpos e essas vidas. A violência não pertence a esse grupo, assim como não pertence às pessoas LGBTQIA+ ou às mulheres. 

Por Lia Junqueira. 

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